Jubarte

A baleia cantora

Conheça a baleia jubarte e saiba como a espécie foi salva da extinção


Vi minha primeira baleia jubarte ao vivo em 1997 ainda como turista e de lá para cá não parei mais de estudar e conhecer estes animais fantásticos. Passei a trabalhar, inicialmente como voluntário e depois contratado, no Instituto Baleia Jubarte onde sou  Coordenador de Pesquisa. Tenho muito para falar sobre as jubartes, mas não vou esgotar o assunto num único post.  Hoje vou falar apenas sobre o canto e como elas foram salvas da extinção. 

Se você for até o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, no sul da Bahia, durante o inverno e fizer um mergulho em suas águas claras terá uma boa chance de escutar um canto que ecoa em meio aos recifes de coral. É o canto de reprodução da baleia jubarte (Megaptera novaeangliae) que se encontra na região dos Abrolhos de junho a novembro para acasalar, parir e criar seus filhotes. O canto é emitido pelos machos para atrair as fêmeas e para sinalizar a outros machos que ele já ocupou aquela área. São verdadeiras sinfonias submarinas.

O som contínuo de menor duração em um canto é chamado de unidade e dura em geral poucos segundos. Uma série de unidades compõe uma frase e uma sequência contínua de frases similares formam um tema.  Os vários temas distintos é que vão formar o canto.  O canto é então repetido por diversas vezes, podendo durar horas.  Uma série de repetições do canto que não tenham nenhuma interrupção maior do que um minuto é chamada de uma sessão de canto. Um canto da jubarte pode ter duração de 6 minutos até meia hora, mas uma sessão de canto pode durar várias horas.

Eu já havia ouvido gravações do canto das jubartes, mas nada se compara a ouvi-las cantando ao vivo no meio do mar. Algumas vezes, quando deitamos no beliche para dormir à bordo de nosso barco de pesquisa, conseguimos ouvir o canto das jubartes ecoando através do casco.  A estrutura do barco acaba funcionando como uma caixa de ressonância e podemos passar à noite embalado pelas jubartes em meio ao balanço das ondas. Aliás, é provável que os antigos marinheiros gregos também conseguissem escutar as jubartes cantando e tenha nascido aí o mito sobre o canto das sereias.



Um dos aspectos mais interessantes é que as jubartes além de cantoras são também compositoras. Elas vão mudando frases e temas, modificando sua estrutura de forma que depois de algumas temporadas o canto está completamente diferente do que era. Os cantos das jubartes do Brasil são únicos, diferente dos cantos das jubartes da Austrália ou do Hawaii. Além disso elas cantam bem alto. Uma única jubarte cantando pode chegar próxima dos 160 decibéis, mais alto que uma turbina de avião a jato. Se você estiver nadando próximo de uma jubarte cantando vai sentir seu corpo vibrar como se estivesse perto do palco num show dos Rolling Stones.

A  canção  das jubartes já deixou o sistema solar. Em 1977  a sonda Voyager foi lançada e levava à bordo um disco com imagens da Terra e saudações em diversas línguas. Os cientistas resolveram incluir o canto das jubartes entre as manifestações culturais contidas no disco. Se a Voyager um dia for encontrada por uma civilização extraterrestre o som das jubartes poderá ser ouvido em meio às estrelas.

Uma jubarte pode chegar a viver cerca de 60 anos e pode ser reconhecida individualmente através das marcas naturais em sua nadadeira caudal. O Instituto Baleia Jubarte tem um catálogo de animais fotoidentificados, com alguns indivíduos conhecidos há mais de 30 anos. É sempre uma felicidade quando reencontramos uma destas baleias mais velhas e constatamos que elas seguem vivas e cruzando as águas do Brasil.

Mas nem sempre foi assim. A caça às baleias, que no Brasil começou em 1602, foi a grande responsável pela diminuição das populações de baleias em todo o mundo. Especialmente durante o século XX, a caça se expandiu com o uso de canhões lançadores de arpão e navios fábrica. As frotas baleeiras varreram os mares e levaram diversas espécies de baleias à beira da extinção. No Brasil estima-se que existiam cerca de 27.000 jubartes no início do século XIX. Quando a caça foi finalmente proibida, em 1966 sua população havia sido reduzida para algo entre 500 e 800 baleias. E mesmo com a caça proibida a espécie seguiu sendo morta até meados da década de 1970 por navios piratas e pela União Soviética.

Ela chegou realmente muito perto da extinção. Como proteger uma espécie que pode chegar a 16 metros de comprimento, pesa 35 toneladas e tem um único filhote a cada dois anos? As ações de conservação foram feitas no sentido de minimizar possíveis impactos sobre as jubartes e proteger ao máximo o Banco dos Abrolhos, sua principal área de reprodução no Brasil. Isso permitiu às jubartes tranquilidade para se reproduzirem e criarem seus filhotes. A espécie veio se recuperando lentamente e, em 2014, foi tirada da lista de espécies ameaçadas de extinção no Brasil. Hoje calcula-se que 20.000 jubartes se reproduzam no litoral brasileiro.

Graças a esta surpreendente recuperação os benefícios com a presença das baleias podem ser sentidos ao longo do litoral. O turismo de observação de baleias cresceu bastante no Brasil e gera renda para as comunidades onde há maiores concentrações de baleias.  Também se descobriu que as baleias têm um papel fundamental no equilíbrio climático e no transporte de nutrientes nos oceanos. Um estudo feito pelo Instituto Baleia Jubarte e pelo Fundo Monetários Internacional indicou que as baleias que existem no Brasil prestam um serviço ao ecossistema no valor de 82 bilhões de dólares.

Hoje em dia o principal desafio é aprender a conviver com esta população de jubartes em nosso litoral e  buscar reduzir os problemas de atropelamento de baleias por embarcações, o emalhe acidental em equipamentos de pesca e entender como as mudanças climáticas podem afetar a espécie.

A baleia jubarte é um raro exemplo de animal que esteve ameaçado mas conseguiu se recuperar e sair da lista de espécies ameaçadas de extinção. Graças às ações de conservação o canto das jubartes será ouvido nos mares do planeta ainda por muito tempo.


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